Eu adoro as fotografias que nós nunca tiramos. Adoro os registros feitos de surpresa, com os corpos em movimento e os sorrisos em abandono. Adoro nossas poses desajeitadas, a mania que temos de falar e falar e falar a cada clique, os resultados que guardamos só pra nós. Eu adoro imaginar nossos retratos juntos, os quais nunca dariam certo pela inconsistência; assim como nós nunca demos. Mas eu adoro mesmo assim.
Eu adoro nosso mal jeito, nossa perda de prumo quando estamos felizes. Adoro a sincronia de nunca sabermos pra onde olhar, quando queremos desviar os olhos um do outro. Adoro quando nossas mãos esquecem os gestos e se encontram numa só. Eu adoro quando caminhamos, mesmo que sempre erremos os passos e tropecemos nos cadarços desamarrados. É, eu adoro mesmo assim.
Eu adoro quando falamos do passado, quando rimos de nossas extravagâncias memoráveis. Adoro quando conversamos do presente e as palavras sempre seguem o mesmo ciclo – que insiste em parar em nós. Adoro quando pensamos no futuro, por mais que suas imprecisões nos assuste e pareçam sempre querer mudar o rumo dessa história (que já nem lembro quando começou; e, principalmente, se começou). Eu adoro tentar me convencer de que todos os nossos quereres poderão se converter numa só verdade. Ah, e eu sou tão cética! Mas eu adoro mesmo assim.
Eu adoro escrever versos sobre ti, ainda que eu nunca os mostre (e não vou mostrar, não insista). Adoro como eles fluem numa mesma simetria, sem precisar de grandes esforços. Ah, eu adoro essas coisas bregas e quase ridículas, que me fazem revirar os olhos e bagunçar o coração (você me dirá que não são bregas ou ridículas, mas sabe que eu acho que, de fato, são). Adoro como nos reinventamos, nos possuímos – e o quanto levamos um pouco mais de nós mesmos a cada instante partilhado. Eu adoro que nunca assumimos coisa alguma usando a voz, que nunca precisamos daquelas tais declarações tão pouco sólidas. Eu adoro que sempre evitamos falar de amor, ainda que saibamos que ele exista. É, eu adoro mesmo assim.
Eu adoro pensar que eu, que sempre odiei tantas e várias coisas, consigo gostar de tantas em ti. E, essencialmente, dos teus defeitos e desarranjos. Eu adoro calcular o quanto somos parecidos, mas adoro ainda mais entender que foram as nossas diferenças que nos uniram. Foram tantos desencontros, querido! Mas eu adoro mesmo assim.
E, caso você leia isso, agora que todos os verbos deveriam estar no pretérito, lembre-se de carregar consigo cada fragmento que restou de nós. Cada lembrança que construímos juntos. Cada despedida que compôs um único adeus. Lembre-se também de que todos os amores são eternos, querido! E que, independente do quanto o tempo tratará de os desgastarem, sempre haverá uma memória que desistirá de cair em esquecimento.
(Ias Rodriguez, 2019)