Era na tarde o azul da casa a me falar desta saudade! Incrustada na mata com sua varanda em colunas brancas, erguendo-se como a me dar forças a seguir. Lá do jardim, aquele cheiro de cajá embriagando meu corpo. Cantava a brisa amores à folhagem. Do sol, um olhar sensual como o dele quando nos amávamos à noitinha... E as flores suspirando molemente, como se o amor morasse ainda naquele lugar. Suspirei também...
Algumas andorinhas vieram pousar no galho do cajueiro bem a meu lado. Eram as mesmas de ontem. Ou eu é que não mudara? Eu era a mesma de quando ele fora embora na tarde... Fiquei pesando minhas saudades, meus temores, meus desejos de vê-lo outra vez...
_ Vem! Arquejei de repente.
Senti a mata triste. Um aperto em meu coração!... “Julio!”... Só o murmurar do vento nas folhas do cajueiro. A saudade entrando em mim...
Senti-me, então, criança. Algo como um ser perdido... Que fazem os animais da mata quando não encontram seus ninhos após um temporal? A interrogação a que me lancei morreu no eco de meus passos. Eu agora seguia pelo caminho do riacho.
_ Não hei de padecer assim, expliquei a meu coração. Dizem que os amores vão-se com as águas dos rios, descem ladeiras, encontram-se com o mar... Já ouvi dizer de flores que levadas por fontes tremem de frio... Sinto que a vida me vai sumindo aos poucos como o sol que desmaia no poente...
Dizem que as mulheres do sertão florescem a cada regresso de seu amor... Pois será que partindo seu amante os lábios ainda quedam-se de seu nome? Ele voltaria? Faço-me essa pergunta todas as noites quando a lua vem brilhar na minha janela... Dizem os mais velhos que mulheres abandonadas choram no clarão da lua... Pois será verdade? Nas histórias que ouço perto das fogueiras acesas nas noites de junho um som de violão vem-me ao peito e anuncia lágrimas a meus olhos. Há tempos chove dentro de mim!... Paro!
Meu cachorro passa correndo em direção ao portão.
_ Aqui, meu menino!
A noite já caíra! Algumas estrelas brilham em meus cabelos negros. Os grilos teimam em brigar com suas asas nas próprias pernas... Eu lutava contra quem? Contra a falta dele em minha cama? Que faz uma esposa quando o homem a quem ama diz que vai ganhar a vida? Morre aos poucos...
... Sons do portão se abrindo...
Quem fosse àquela hora a me visitar estaria sendo lambido por meu cachorro... Traidor! Nem ladrara como um animal que protege seu território...
Então, passa-se uma cena... Meus olhos descobrem-se com o luar nos cabelos grisalhos...
Eis uma tarde triste que se ilumina ao sair da lua! Cantavam as cotovias ao fundo da mata! O vento bate em meus cabelos namorando meu rosto. E aí! Ergo totalmente os olhos!
Que belo semblante! O chapéu nas mãos em cumprimento tal meu pai fazia ao entrar em uma casa... Meu corpo desceu do trote que fazia com minhas lembranças e caminhou baixinho, faceiro, requebrando em direção ao portão...
A imagem corre dentro de mim... Rasga-se meu peito em mil perguntas...
O sertanejo voltara de são Paulo...
_Julio! ...
Meu corpo já não é livre... Sou prisioneira dos braços dele!
(Livro de ouro do Conto brasileiro. Jun 2009, pág. 58-9.)