O meu silêncio comporta todos os sentimentos
É um ímã dos meus sentidos
Vai decantando por dentro cada um dos meus valores
Calando dentro da alma o dicionário da vida
Assuntando o chiado do caldeirão dos exemplos
Até que se harmonizem na imensidão do meu peito
Eu e meu silêncio, eu e meus cachorros
Também silenciosos, de olhos solidários e serenidade nos gestos
Fazendo companhia à cisma do fim da tarde.
Eu e meu silêncio, eu e minhas rosas
Que como as rosas de Cartola também não falam
Exibem-se imponentes afirmando-se sobre o nu do meu silêncio
Que se afirma em contemplação à sua beleza.
Eu e meu silêncio, que grita desvairado
E queima minha lenha, consome a minha fogueira
O remorso e eu no silêncio que me arde, purgando todos os meus pecados.
Um minuto de silêncio que o remorso está de luto! Sempre de preto, calado, corrosivo, quente, implacável.
É no silêncio moral onde o remorso vem cobrar suas dívidas.
É do silêncio da noite que se renovam as manhãs.
A treva é a soma de todas as cores que estão por vir
A ausências das luzes, o silêncio dos cegos
A angustia da busca, a penumbra da alma, arco-íris oculto
Cegos em meio ao silêncio das cores guiados pela magia das sensações inexplicáveis. Cego vivo eu imerso no silêncio que me guia. E não me perco.
O silêncio dos justos, o silêncio de Cristo que calou a Judéia
A revolta calada cativando a fúria. O silêncio valente.
A serpente dormente à espreita do bote. O silêncio covarde.
O cochilo na mira, a explosão da espoleta e o tiro preciso. O silêncio certeiro.
O silêncio do amor, a paixão de tocaia e o suspiro do gozo
O túmulo do meu silêncio é a fortaleza da minha cidadela
Assim sou forte, invencível, sertão.
Nenhum estilhaço me abate. Nenhum olhar me penetra.
Calo tudo, calo fundo, calo o peito.
Fico mudo, fico ausente para o mundo.
Calo a voz, calo o gesto, o canto silencia
Só os olhos anunciam o desenlace da batalha.
Resolutamente silenciosa.
A sinceridade se esconde na escuridão do silêncio.
É lá que se ilumina a luz da sua virtude
Não há decisão sincera que não tenha sido parida nas entranhas da solidão da alma. O mais é fraude.
Silêncio não é calmaria. Silêncio é o coração da tormenta.
O silêncio é mais retumbante na revolta dos mares que na acomodação do cais
Entre uma onda e outra sempre há o intervalo do silêncio para os deformados, aqueles que nasceram com coração no lugar dos ouvidos.
O silêncio se manifesta pela ausência das palavras. É barulho que emudece.
Impõe-se como uma flâmula do respeito. O respeito das cacimbas profundas.
Que matam a sede, mas também metem medo.
Fornecem peixe e tragam a vida se ela for afoita.
As silenciosas cacimbas que banham o sujo dos homens