Na periferia, sob um calor fúnebre, crianças cantam um canto de morte – apólogo musical apocalíptico que não tardará a manusear sua batuta espectral sobre mentes de almas incautas. Pobres almas inocentes que apenas repetem o que se tornou comum nas telas que as hipnotizam no dia-a-dia; a maioria nem entende esse cântico lascivo, empurrado goela acima pela mídia devoradora de cérebros sem discernimentos. É a inocência sendo violentada pela maestria da glória do ibope. Não mais como a inocente violência do “cravo brigou com a rosa...”.
Mas esse carrasco de mentes não ceifa apenas a inocência. Além de induzi-la ao suicídio cerebral - via escrachos televisivos e letras de sentidos duais -, ele também rege (sem graça) um insosso elenco de comediantes em performances cômicas triviais, caricaturadas com maquiagem de cultura inútil. E no saguão dessa inutilidade, o sarau de letrados. Plateias enganadas, induzidas pela mídia através de páginas culturais. Fila ao relento para compra do ingresso que endossa o pseudo-cult: mera apologia a musica de duplo sentido. Retrato e caricatura musical proliferada nas periferias. Condenação de inocentes a uma orquestra de mortes.
Aplausos ao plágio na penumbra dos intervalos de factoides. Prenúncio ensaiado de meus atuais temores: vanguardismo de atores com enredos sem nenhum senso crítico social, apenas cópias do “besterolismo televisivo” em voga. Nas cadeiras enumeradas, o sorriso se escancara; reflexos do palco corroendo mentes que se deixam alienar, mentes sem dois pesos e sem duas medidas. Enquanto isso, nos intervalos da vida como ela é – em camas enumeradas -, alguém paga por um corpo aliciado pelas musicas de duplo sentido; preço não menos igual do que o ingresso da comédia apelativa.
A essa bruta e inteligente gente, cuja alma ainda padece com a crença no diabo – peleja medieval com um deus raivoso, proprietário de lotes divinais... -, não restará saída: a (in) evitável sina da subjugação às letras e trejeitos ocasionais do desespero de “cantores e atores” fugindo do anonimato. Monólogo de um único ato: O aliciamento da mente! Na falta de opção, aguardemos, então, a ressurreição da alegria dos nossos antigos palhaços.
Mas eles teimam em não querer voltar, até parece que o verdadeiro riso – lembrança de expressão genuína e ancestral - que é, em última instância insubstituível, ficou preso no tempo das brincadeiras-de-rodas. As pétalas de rosa já secaram debaixo da escada, as lembranças do cravo ferido ainda representam o momento (in) evitável à minha dorida sina: aceitar que “Meus heróis morreram todos...” A “idiolatria” presente já não se preocupa com flores feridas, não rega o estrume da essência da busca da inocência perdida; apenas se escancara com letras apelativas enquanto estas racham a mente da criança que acorda querendo apenas... Sorrir!
Às vezes, nas tardes sem sesta, a ingenuidade ressurge sem horários definidos e emana um momento de graça em meio ao sono dos “quase mortos”. Nesse paradoxal televisivo (besteirol e plenitude), a lacuna da falta do que mostrar ressuscita velhos fantasmas comediantes; sem apelação, sem maquiagens deformadoras... Sem os gumes das palavras de duplo sentido que sangram crianças nas periferias. É o retorno da “perda irreparável”, nas ingênuas e previsíveis situações cômicas, fazendo seu lado social: dando esperança aos pequeninos através do riso!
O que nos resta é esperar que crianças tenham, no mínimo, um enterro digno diante dos fantasmas de nossos antigos comediantes.