Poesia

Sob a sombra da nudez cromática

Para quem as ama, não há como privá-las; seremos sempre prisioneiros de suas amarras implacáveis. Elas brotam livres, mesmo diante da nossa descrença em tê-las... Às vezes, vêm solitárias; em outros momentos, aos torrões. Por instantes ou longos tempos, conturbam o nosso confronto entre o Ser e o Ter. Passamos então a questionar a dualidade da nossa alma: sermos simples ou pedantes de conhecimento; sermos arrogantes ou nos humildar ante a sabedoria dos brutos que sobrevivem sem conhecê-las; despirmo-nos dos preconceitos ou nos tornarmos cúmplices de nossas ações predadoras... Ah! Como somos vítimas de nossas ingenuidades. Estamos sempre arremetendo conceitos sem volta como se fôssemos donos de verdades absolutas. E em nosso silêncio - momento juiz das arrogâncias - nos descobrimos simples arqueiros de verbosidades fúteis, muitas vezes, inúteis. Assim, criamos arquétipos – nossas “imagens primordiais” - para os confrontos inevitáveis e recebemos na carne e na alma o repuxo do arco nem sempre bem usado.

Tem dias em que elas chegam desprovidas de cores. E nessa nudez cromática, reflito-me como parte desse arco-íris incolor, criando uma auto persona monocromática machucada pela ânsia da minh ‘alma criadora - ao mesmo tempo, alma atormentada pela pequenez da relutância em versejar para os olhos do mundo, cegos de poesia. Nesta ausência, dói-me o vazio da inspiração neste terrível dilema de começar a saciar o meu “self” no cio e embarcar nessa nau sem volta; nau que abre caminhos que nunca serão nossos, muito menos estradas temporais. Assim, tentando integrar e equilibrar os aspectos anímicos para a estabilidade da nossa personalidade humana, tornamo-nos vítimas e algozes da sempre presente angústia sobre o quê divagar nas estradas anímicas. Mesmo sabendo que, atrás desta tentativa de coloração do orbe, seguem-nos passos de discórdia e, poucas vezes, aclamação... Em outros barcos, singram e sangram os descontentamentos de quem não teve a coragem de ousar!

Com o tempo, depois do arremate primeiro – já domadores de textos “xucros” - passamos a fugir do rebusco da próxima sangria. Com elas, adornadas pela acidez e pela ode ocasional, já nos expressamos como seres mais (in) racionais. Aos poucos, cai o véu. Descobrimo-nos meros coadjuvantes de pensamentos contrariados, expostos aos conceitos de um mundo cada vez mais cheio de dilemas: dilemas morais, éticos, (in) consensuais.. Dilemas cada vez mais distantes do metafísico e da psique. E como dói nossa ínfima vontade de perdurar como homens supremos de conhecimento. Assim se inicia nossa intima guerra de confrontos inevitáveis: o Ser e o Ter! Ser e não ter, Ter e não ser... Substitutos que se digladiam em buscas de efêmeros saberes. Porém, eternos, e nem sempre ternos!

Com o tempo, muitas vezes, passamos a desprezar aquilo que não entendemos. Resguardamos nossas tolerâncias para os significados do autoconhecimento que navegam em águas calmas de sobrevivência. Tornamo-nos parte melancólica de um navegante solitário ante suas palavras de conforto: “Tenho minha verbosidade, logo existo...” No anverso dessa aquarela, acobertado em simples trapos mal dormidos, alguém sussurra para a noite em sua isenta meditação: “Tenho um manto; logo sobrevivo...” Dia-a-dia, no clarear das nossas luzes profanas e sagradas, negamo-nos adentrar em mar de conhecimentos tenebrosos; preferimos a comodidades daquilo que já foi escrito na miniatura dos nossos arquétipos de comodidade – mesmo navegando rumo ao cemitério de antigos conceitos subjetivos, porém necessários para o lastro dos nossos hodiernos pequenos barcos de sobrevivência – quase sempre entregues aos ventos da discórdia e da arrogância!

No fundo, queremos que se dobrem aos nossos pés aqueles que não velejaram sob o nosso vento de aprendizagem... Como somos ingênuos ante ao nosso pedantismo de conhecimento – conhecimentos, muitas vezes, vãos. Como nos enganamos ante as nossas câmeras de arestas limitadas, como nos sufocamos vendo a simplicidade da maneira de viver daquele que não se enfeitou nas ruas com livros de capas grossas e nem se protegeu sobre o negrume das togas dispensáveis. Como sofremos ao crer, no limite das nossas descrenças, que não somos donos de nenhuma verdade... Carregamos apenas nuances de conhecimentos passageiros. Ah! E como doem as palavras mal-ditas, mal escritas... E como gozamos com um simples suspiro que finaliza textos inacabados. Textos enredados, muitas vezes, por inúmeros conceitos de existências (ultra) passadas .Pobre de mim - rele mortal - moribundo na borda do sepulcro de infinitas palavras prontas a se reencarnarem na ignorância do pedantismo do nosso rele saber.

Hoje, quero apenas o conforto que brota da simplicidade das palavras de que fui capaz de escrever!

Kal Angelus Kal Angelus Autor
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