Fico esperando que as palavras me acudam
O reino das palavras de que falava Drummond.
Palavras doces, redondas ou mesmo obliquas
Que soem estranhas, sonoras, soturnas, antigas
Palavras proféticas, difíceis, versáteis, profundas
Que me façam poeta, embora sem o dom
Ô reino encantado, coberto de pedras e de algas
Como descobrir teus segredos de alcova?
São tantas lançadas ao vento, perdidas palavras
Como esculpi-las, amadurecê-las, burilá-las
Se nem li os livros dos profetas e desconheço a fala
Dos Messias e os ensinamentos da liturgia nova?
Será pelo cheiro que escolho as palavras?
Mergulho o olfato em algum dicionário...
Ah, se fosse tão fácil
Jamais haveria um poeta ordinário!
Melhor revolvê-las, como a terra que lavra
O camponês sereno, insistente, hábil
Garimpar palavras escondidas em uma mina
Lapidar hélices de helicóptero
Suaves olhos de amêndoa
Multiformes larvas de coleópteros
Unidas como o caju e a nódoa
Oh, brilhantes e inflamáveis parafinas
Não tendo eu pendores para o garimpo
Nem sensibilidade poética no olfato
Ou a paciência heróica do lavrador
Contento-me em garimpar a minha suja dor
Cheirá-la, banhá-la, semeá-la, dar-lhe um trato
E lançá-la disfarçada de um poema limpo.