Quando nossos olhos eram tapados,
Tínhamos incontrolável vontade de ver.
E nossas bocas quando oclusas,
Sufocavam enorme grito.
Quando presas nossas mãos hidrófobas
E contido nosso choro infame,
Possuíamos o mais refinado ideal.
Mas quando Descobriram os nossos olhos
E destaparam a nossa boca,
Permitindo que gritássemos e gemêssemos e cantássemos.
Já não éramos mais os mesmos. Mudamos. Mudaram-nos.
E por nossos filhos crescerem mudos, tivemos netos taciturnos.
Preferiram adequar-se à omissão indolente.
Não gritam, não gemem, não cantam o desejo que um dia foi tido por nós.
Pobre de nós, de nossos filhos e filhas hoje tão adaptados.
Hoje nos roubam e xingam na nossa face,
Desfalcam a nossa integridade e furtam os nossos direitos.
Impõem-nos altos impostos e nos oferecem pão e circo. Aceitamos.
Já não somos mais os mesmos. Mudamos. Mudaram-nos.
Vivemos então, adaptados, com o que permitiram que pudéssemos ser.
E então já roubados, xingados e desfalcados, aceitamos.
Destaparam a nossa boca, mas roubaram a nossa voz.
Permitiram-nos viver. Atônitos. Medrosos. Mudamos. Mudaram-nos.